domingo, 30 de dezembro de 2018

Verosimilhança e verdade



Chama-se verosimilhança ao atributo daquilo que parece intuitivamente verdadeiro. "Vero" significa verdadeiro; "simil", semelhante; ou seja, o que é verosímil é semelhante ao que é verdadeiro. No caso da obra literária, verosimilhança quer dizer semelhante à realidade.
No entanto, muitas obras de ficção apresentam realidades fantásticas, irrealistas, afastadas da realidade conhecida e, ainda assim, não suscitam rejeição, nem sentimentos de inverosimilhança. Porque o referente do leitor deixou de ser a realidade que conhece do dia-a-dia e passou a ser a realidade construída pela narrativa apresentada.
Então, verosimilhança, em sentido mais abrangente, não é a semelhança dos elementos da obra com o mundo real, mas a credibilidade que esses elementos suscitam em relação ao mundo de ficção apresentado.
Cada obra de ficção possui uma lógica interna, que se torna o referente do leitor. Harry Potter pode perfeitamente sobrevoar Londres numa vassoura voadora; Hercule Poirot, de modo nenhum.

Para alguns autores, o verosímil é ainda mais exigente do que o verdadeiro, já que a verdade, às vezes, não é verosímil.

domingo, 23 de dezembro de 2018

Prelúdio de Natal

Tudo principiava
pela cúmplice neblina
que vinha perfumada
de lenha e tangerinas
Só depois se rasgava
a primeira cortina
E dispersa e dourada
no palco das vitrinas
a festa começava
entre odor a resina
e gosto a noz-moscada
e vozes femininas
A cidade ficava
sob a luz vespertina
pelas montras cercada
de paisagens alpinas

[David Mourão-Ferreira]

sábado, 22 de dezembro de 2018

BOAS FESTAS!




As mulheres/trabalhadoras/leitoras desejam aos  leitores da Comunidade de Leitores das Bibliotecas Municipais de Loures um Natal feliz e um Ano Novo com paz, livros e leituras.

Deixamos um  presente, um poema do poeta José Carlos Ary dos Santos, com o título Quando um homem quiser.

Tu que dormes à noite na calçada do relento 
numa cama de chuva com lençóis feitos de vento 
tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento 
és meu irmão, amigo, és meu irmão 

E tu que dormes só o pesadelo do ciúme 
numa cama de raiva com lençóis feitos de lume 
e sofres o Natal da solidão sem um queixume 
és meu irmão, amigo, és meu irmão 

Natal é em Dezembro 
mas em Maio pode ser 
Natal é em Setembro 
é quando um homem quiser 
Natal é quando nasce 
uma vida a amanhecer 
Natal é sempre o fruto 
que há no ventre da mulher 

Tu que inventas ternura e brinquedos para dar 
tu que inventas bonecas e comboios de luar 
e mentes ao teu filho por não os poderes comprar 
és meu irmão, amigo, és meu irmão 

E tu que vês na montra a tua fome que eu não sei 
fatias de tristeza em cada alegre bolo-rei 
pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei 
és meu irmão, amigo, és meu irmão 

Ary dos Santos, in 'As Palavras das Cantigas' 

BOAS FESTAS!

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

"O Império dos Pardais" no Museu Municipal de Loures


A 4ª sessão da Comunidade de Leitores das Bibliotecas Municipais de Loures  realiza-se no Museu Municipal de Loures com a presença do autor João Paulo Oliveira e Costa. 

João Paulo Oliveira e Costa, nascido em 1962, é doutor em História e Professor Catedrático da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. É Diretor do Centro de História de Além-Mar (CHAM) e membro da Direção do Centro de Estudos de Povos e Culturas de Expressão Portuguesa da Universidade Católica Portuguesa. Foi um dos coordenadores científicos das Biografias dos Reis de Portugal e autor de D. Manuel I, publicado nesta coleção. Iniciou-se na escrita de ficção com o romance O Império dos Pardais (2008), a que se seguiu O Fio do Tempo (2011).
SINOPSE
Um romance histórico que tem como pano de fundo a afirmação do Império Português, o império dos pardais, durante o reinado de D. Manuel I e se centra em torno de cinco personagens principais que se movem dentro da lógica do mundo da espionagem. A personagem central é uma espia excecional que pensa abandonar uma vida dedicada à violência e à satisfação de instintos primários, em que fora forçada a entrar, para recuperar uma vida social normal ao lado de um artista talentoso, apaixonado e ingénuo. A sua luta interior (contra hábitos sedimentados por quinze anos de isolamento, de rancor, de secretismo e de memórias perturbadoras) e o seu esforço para se libertar dos seus antigos mandantes percorrem toda a narrativa. A vida desta mulher cruza-se com a de dois supostos responsáveis pelos serviços secretos de D. Manuel I e amigos pessoais do rei. Ao acompanhar os encontros e desencontros, o leitor vive as cores, os aromas e os quotidianos de um tempo extraordinário em várias cidades e portos por onde vão passando e vivendo as personagens deste romance, que homenageia um povo e um rei.


domingo, 25 de novembro de 2018

Saramago em Concerto



Na última passagem de ano, desloquei-me com o grupo familiar habitual ao espaço fronteiro à Torre de Belém, onde a autarquia prometia música e fogo de artifício. A surpresa foi muito agradável. Até à meia-noite, atuou um conjunto muito curioso: formado por três violas, bateria, piano e três metais, só tocam músicas dos Beatles, copiam-nos em tudo, até nas roupas. Dão pelo nome de “Get Back Beatles” e são brasileiros. O esforço rende resultados: abstraindo-nos um pouco, quase acreditamos que estamos a ver e a ouvir os autênticos, quarenta anos depois, em Lisboa, todos vivos e jovens.
Admirei-os por terem conseguido arranjar um nicho de mercado original e rendoso.
Este revivalismo vem acontecendo com outras formulações. Tomei conhecimento de que, num clube privado, um grupo fazia a passagem de ano só com a banda sonora de uma novela brasileira. Uma passagem de ano temática.
Sempre atento às oportunidades de ganhar dinheiro com a literatura, dei por mim a pensar como se aplicaria o conceito ao ramo literário:
Seria possível encher um pavilhão, a pagar, para ver um autor a criar um conto? Várias câmaras captariam a folha onde o escritor alinharia as palavras, apresentando em grandes ecrãs panorâmicos com que palavras começava, quais cortava, mostrando o conto a nascer e a crescer, paulatina, mas inexoravelmente. Outras câmaras mostravam que apoios consultava, que palavras procurava nos dicionários, que partes ia aproveitando. Seria de evitar que o escritor

sábado, 17 de novembro de 2018

Comunidade de Leitores das Bibliotecas Municipais de Loures presente no III Encontro Ibérico de Leitores de Saramago, no Feijó


                             



No passado fim-de-semana realizou-se o III Encontro Ibérico Leitores de Saramago, na Biblioteca Municipal José Saramago, no Feijó. Organização da Câmara Municipal de Almada, Câmara Municipal de Beja/Biblioteca Municipal de Beja José Saramago e Aula Saramago.  No espaço dedicado aos Leitores de Saramago, esteve o representante da Comunidade de Leitores das Bibliotecas Municipais de Loures, Joaquim Bispo que apresentou a sua interpretação da obra literária "História do Cerco de Lisboa". 
Na última edição,  esta obra esteve em análise numa das sessões da Comunidade de Leitores, depois dos leitores viajarem até Almada,  ao Teatro Municipal Joaquim Benite para assistir a uma adaptação da obra de Saramago,  com dramaturgia de José Gabriel Antuñano e encenação de Ignacio García.
O IV Encontro, em 2019, realizar-se-á na Biblioteca Municipal José Saramago, em Loures.



sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Fala-lhes de Livros...

Fala-lhes de Batalhas, de Reis  e de Elefantes de Mathias Énard foi a obra literária que esteve em análise no passado dia 15 de novembro, na Biblioteca Municipal José Saramago, em Loures. A partir deste livro encheu-se uma mesa de cultura - livros, fotografias, objetos e outras coisas boas para no final da sessão podermos degustar.

Fala-lhes de Batalhas, de Reis  e de Elefantes

Construir uma ponte, não sob o estreito de Bósforo, mas entre a cultura, Miguel Ângelo, a literatura, a poesia, a pintura e a escultura. Vamos ver se a nossa ponte não é só um esboço de ponte.
Estamos perante um livro com poucas páginas, capítulos curtos, com um ritmo, que segundo o autor tem a ver com o ritmo do próprio Miguel Ângelo. Aliás o autor diz numa entrevista que o livro foi pensado como um “sketchbook” (livro de esboços), como os desenhos do próprio Miguel Ângelo. Mesmo o autor considerando-o um esboço, apresenta-nos um texto muito rico, belo e poético e é uma pérola, porque nos remete para o conhecimento, não só da vida do artista, mas para o conhecimento de um modo geral. Porque com este livro procuramos saber mais coisas. O próprio autor refere que teve de pesquisar muito para construir esta narrativa, e que demorou três anos a escrevê-lo.
A história deste livro é muito engraçada, porque o autor parte de um suposto convite do Sultão Bayzid (que reinou durante 31 anos, em Constantinopla.) e conta-nos um episódio da vida do grande artista Miguel Ângelo – a sua ida para Constantinopla (1506). ( o convite parece que existiu e ao que parece poderão existir esboços dessa ponte, mas Miguel Ângelo parece que nunca esteve em Constantinopla). João Paulo Oliveira e Costa, explicou numa sessão que existem os chamados buracos na história, entre as fontes , um hiato de tempo,  que levam os ficcionistas a usar da sua imaginação e escreverem romances do género histórico por conta disso. Este parece ser o caso.
Miguel Ângelo, teria 31 anos e já era um conceituado artista ou mesmo o maior daquele tempo, muitas vezes comparado a Leonardo Da Vinci que era 20 mais velho.
Tem uma oferta simpática de uma quantia avultada de dinheiro, por parte do Sultão e estando desavindo com o Papa Júlio II, terá aceitado. Há um pormenor que acaba por ser decisivo para ele aceitar o convite que foi o facto de Leonard Da Vinci ter sido anteriormente convidado e já ter feito um esboço para a tal ponte ser construída sobre o Corno de Ouro – uma ponte que unirá o lado ocidental do lado oriental da capital do Império Otomano. Consta que o Sultão terá rejeitado o projeto de Leonardo Da Vinci por não gostar dele esteticamente. O orgulho fala mais alto e leva Miguel Ângelo a aceitar.
Através desta obra literária também ficamos a conhecer um pouco do que era Constantinopla naquela época. Uma cidade cheia de gente de todas as crenças – os judeus, tinham sido expulsos de Portugal e também de Espanha, e os mouros haviam perdido o reino de Granada.) Portanto é uma Constantinopla de muitas línguas e culturas. Mathias Énard, é um escritor francês, premiado com o mais prestigiado prémio literário da França, o Prix Goncourt (com o livro Bússola, em 2015. Também recebeu o prémio Prix Décember, 2008 pelo seu livro Zona e por este “Fala-lhes de batalhas, de reis e de elefantes” Prix Goncourt Lycéene, 2010. Tem seis romances, mas penso que só três estão traduzidos na língua portuguesa.
 O autor viveu mais de 10 anos no Oriente, nomeadamente na Síria, na Líbia, Irão e Egito que ao todo faz mais de 10 anos. Sempre se interessou pela cultura oriental, estudou árabe e persa e é um académico especialista em literatura oriental.  É professor de árabe na Universidade de Barcelona, cidade onde vive.
É uma das vozes mais relevantes da literatura francófona. O autor já esteve em Portugal na Noite de Literatura Europeia.
Énard com este texto mostra-nos uma possibilidade de relações entre o Ocidente e o Oriente.
Com este livro chama a atenção para outras pontes, penso que metaforicamente o autor alerta para a necessidade de se estabelecerem pontes entre o ocidente e o oriente. No livro diz-se “São belas as pontes, se perdurarem”. É uma visão muito interessante.
O autor ficciona também uma relação com o poeta Mesihi (que existiu e foi um mestre da renovada poesia otomana). O poeta apaixona-se pelo escultor, que por sua vez sonha com a dançarina, vinda da Al-Andaluz (depois dos reis católicos terem destruído aquele lugar de coexistência pacífica entre muçulmanos, judeus e cristãos). São pessoas muitos diferentes do artista, mas que nos transporta para a ideia  de nos relacionarmos com o outro e aceitarmos as diferenças dos outros.
Parece haver um jogo de oposições que se desenvolve no texto.   Papa / Sultão; Cristão / muçulmano; guerra / poesia; leste / oeste; homossexualidade / heterossexualidade. De fato, a construção dessa ponte aparece na história como a solução.
É um livro brilhante que desafia o mito, a imaginação e a fantasia. O autor faz-nos entrar na mente de um génio, que é um turbilhão de ideias e que contribuiu um mundo mais belo, porque podemos ainda hoje apreciar as suas esculturas e pinturas. Através deste livro poderemos fazer uma viagem pela arte e por isso este livro está recomendado no PNL para jovens para motivar ao conhecimento das obras de arte espalhadas por Itália (sobretudo Florença e Roma).
                                Pietá de Miguel Ângelo


sábado, 10 de novembro de 2018

Entre o Sagrado e o Profano
















Os leitores da Comunidade de Leitores no percurso pelo Património de Santo Antão do Tojal, entre o Sagrado e Profano, com visita guiada ao Palácio dos Arcebispos, Igreja Paroquial, Aqueduto, Fonte Monumental, Chafariz, entre outros apontamentos culturais. Apesar da chuva, a visita revestiu-se de grande interesse para os leitores.





A Comunidade de Leitores na Rota do Memorial do Convento

No passado dia 18 de outubro de 2018 realizou-se a 1ª sessão da Comunidade de Leitores, com o título "Passar o tempo pelo tempo". O título é um jogo de palavras para o tempo - tempo que partilhamos em conversas literárias e outras e o tempo real que nesta edição, nos transporta para um outro tempo, já passado - o tempo da memória.
Duas obras literárias Memorial do Convento, de José Saramago, e Nove Mil Passos, de Pedro Almeida Vieira, foram os dois romances debatidos nesta sessão que contou com dois escritores, Miguel Real, comissário da Rota do Memorial do Convento e que nos veio falar do "Memorial do Convento" de José Saramago e Pedro Almeida Vieira que falou da sua obra literária "Nove Mil Passos"
A conversa centrou-se no reinado de D. João V, época que se realizaram duas grandes obras - O Convento de Mafra e o Aqueduto das Águas Livres, com finalidades bem distintas e também razões e histórias bem diferentes. Falou-se do Palácio dos Arcebispos, em Santo Antão do Tojal,onde decorreu esta sessão. Neste Palácio pernoitava o Rei e foi também aqui que os sinos do Convento de MAfra foram benzidos e poderiam falar de outros pormenores, alguns relatados nas obras literárias em análise.
Esta sessão, integrada na programação da Rota Memorial do Convento, um projeto intermunicipal dedicado à obra de José Saramago, realizou-se no Palácio dos Arcebispos, um dos imóveis classificados por esta iniciativa cultural e patrimonial. Loures, Lisboa e Mafra são os municípios que integram este projeto, que tem a Fundação José Saramago como parceiro estratégico.
Quase meia centena de pessoas participaram nesta sessão, entre elas, o presidente da União das Freguesias de Santo Antão e São Julião do Tojal, João Florindo. Antes de se iniciar o serão de reflexão, os dois escritores e o público foram presenteados com um momento de arte performativa, concebido e interpretado por Tânia Botas.
No dia 10 de novembro realizar-se-á um percurso pelo património de Santo Antão do Tojal, entre o sagrado e o profano e visitaremos o Palácio dos Arcebispos, Igreja Paroquial, Aqueduto, Fonte Monumental e Chafariz e  e que certamente complementará a leitura dos romances referidos.
A próxima sessão, de leitura e reflexão, da Comunidade de Leitores será dedicada ao livro Fala-lhes de batalhas, de reis e elefantes, de Mathias Énard. A iniciativa irá decorrer na Biblioteca Municipal José Saramago, em Loures, a 15 de novembro.




domingo, 28 de outubro de 2018

A Tese na Literatura


(excertos)
Todo texto defende uma tese.
Quando afirmamos isto, não nos referimos apenas a textos académicos ou teóricos, mas a todo e qualquer texto, incluindo o texto literário.
A tese, ou a proposição, é aquilo que é posto diante dos olhos do leitor, aquilo que o autor deseja apresentar.
Numa carta de amor entre namorados, a tese é provar os sentimentos amorosos de um para o outro; num texto teórico universitário, a tese é a demonstração e comprovação de uma hipótese; em qualquer texto, existe uma tese, uma ideia a ser defendida, mesmo que ela esteja diluída e pareça ser inexistente.
Na Literatura, a tese costuma transparecer de duas maneiras mais comuns: explicitamente, quando a proposta do texto é convencer o leitor a aceitar a tese, ou implicitamente, quando o texto estimula o leitor a concluir, por si só, qual é a tese.
Na verdade, apenas uma obra com objetivo explícito é compreendida por alguns leitores; nem todos possuem o refinamento para ler as entrelinhas de um texto cuja tese esteja disfarçada.
Entretanto, a História da Literatura costuma destacar os autores que conseguem defender suas ideias sem dogmatismo, sem proselitismo. Via de regra, uma obra de Arte é aquela capaz de tocar, de algum modo, todas as pessoas, concordem elas ou não com a tese apresentada.
E, para muitos leitores, desvendar os mistérios de uma obra literária para desvelar seu sentido é uma grande recompensa. Prémio comummente recusado por obras panfletárias.

Henry Bugalho


domingo, 30 de setembro de 2018

A folha antes branca



Escritores sem inspiração é o que mais há! Silvino tinha lido que é mais fácil quando se escreve sobre o que se viu e viveu, e matou toda a família. As teclas feriram as folhas por um semana. O texto escorria sangue.
A editora gostou. Os outros presos também, e pedem-lhe autógrafos.

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

edição 2018/2019 da Comunidade de Leitores das Bibliotecas Municipais de Loures

Caros leitores,
Eis o programa desta edição da Comunidade de Leitores. "Passar o tempo pelo tempo". É isso que vamos fazer até maio de 2019. Passar um bom tempo, em conversas literárias que nos dão prazer e que nos alimentam. Revisitar um tempo ou tempos, leituras, Saramago e outros autores. Vai ser bom o reencontro e o local não poderia ser melhor - Palácio dos Arcebispos, em Santo Antão do Tojal.


domingo, 26 de agosto de 2018

A extinção do Português



Há tempos tive a visão clara da extinção do Português. Um grupo de brasileiros, provavelmente recém-chegado, tentava fazer-se compreender num restaurante de Lisboa. E entender o empregado. Um deles acabou por exclamar: — Não entendi porra nenhuma!
Estará o Português em perigo? A incomunicabilidade entre versões de uma língua é um forte sinal de alarme. Uma língua tem um comportamento semelhante a uma espécie viva: evolui a partir de uma antepassada, ganha massa crítica de indivíduos, autonomiza-se, cria rebentos semelhantes, pode expandir-se, pode ficar isolada, definhar e morrer.
Hoje, existem cerca de seis mil línguas, fora os dialetos, mas todos os anos desaparecem dez, em média. Com elas perdem-se os tesouros culturais que veiculavam. E, tal como as espécies, uma língua, uma vez extinta, não reaparece mais. O limite da sobrevivência situa-se por volta dos cem mil falantes. Na história humana terão já desaparecido mais de vinte mil línguas. Algumas, pelo contrário, sobrevivem há mais de dois mil anos. O segredo do sucesso parece ser o grande número de falantes. Como o número de indivíduos nas espécies, o número de indivíduos que usa uma língua assegura-lhe a continuidade.
Neste ponto, o Português, com os seus 250 milhões de falantes, tem boas condições de sobrevivência e até de expansão. Só o Brasil tem quase 210 milhões. Outros milhões são falantes em grandes países africanos com excelente potencial de crescimento. É uma das nove línguas que, só elas, congregam metade da população mundial. É como uma espécie endémica; o seu êxito é inquestionável. Evoluiu do latim, a partir do regionalismo galaico-duriense, e conseguiu constituir-se como língua autónoma, apesar do convívio contagioso com o castelhano. Mas estes 250 milhões ainda falam uma só língua?

domingo, 22 de julho de 2018

Homofonia



Bom dia! Uma sandes de fiambre, se faz favor!
Só à uma.
Só há uma? Ótimo. Pode ser essa…

domingo, 24 de junho de 2018

Graus de Complexidade Textual



Classificação, gradação crescente e caracterização:


    Textos não complicados:
Textos desafiantes:

Textos complexos:


Relações:
básicas, evidentes;
por vezes implícitas;
subtis, enredadas, não evidentes;
Riqueza:
mínima, limitada;
moderada, maior pormenorização;
bastante significativa, altamente sofisticada;
Estrutura:
simples, convencional;
mais complicada;
elaborada, por
vezes não convencional;
Estilo:
simples, acessível;
mais rico, menos evidente;
frequentemente intrincado;
Vocabulário:

familiar;
algumas palavras difíceis,
contextualmente dependentes;
exigente, contextualmente dependente em elevado grau.
Intenção:
clara.
expressa com alguma subtileza.
implícita e
por vezes ambígua.



segunda-feira, 4 de junho de 2018

Comunidade de Leitores comemorativa do 2º aniversário da Biblioteca Municipal Ary dos Santos, com Sandro William Junqueira


Caros leitores desta Comunidade. A sessão especial da nossa Comunidade de Leitores é já dia 9 de junho, pelas 21H00, na Biblioteca Municipal Ary dos Santos. Não perca esta oportunidade de estar à conversa com Sandro William Junqueira. Quando as Girafas baixam o Pescoço, é o seu quarto romance e fala-nos da vida de  pessoas banais. Livro muito intenso e duro. Apareça porque vai valer a pena.








domingo, 27 de maio de 2018

“Alma cibernética”



O primeiro processador compunha frases simples, a partir de longas listas de substantivos, adjetivos, verbos e complementos. Os seguintes geravam conjugações mais complexas. Por fim, o inventor publicou um livro de poemas.
A crítica elogiou-lhe as sonoridades e a profundidade de algumas reflexões.

domingo, 29 de abril de 2018

Funções da Literatura


1) Função lúdica: forma de brinquedo, diversão, entretenimento, jogo, despertar de emoções agradáveis, distração, sem qualquer finalidade prática e utilitária.
2) Função pragmática ou social: é uma função ética, utilitária e prática porque é a função do engajamento, da denúncia, da crítica. É a literatura compromisso ― arte como meio de consciencialização. Tem como objetivos: convencer, atrair adeptos, ensinar e esclarecer, difundir valores.
3) Função sincrónica ou sintonizada: através da Literatura restauramos emocionalmente o passado. Nesse sentido, cada leitor é um recriador de emoções.
4) Função cognitiva: é a função do reconhecimento. A Literatura funciona como elemento revelador da verdade oculta sob as aparências. É também a função da descoberta. Esta função está centrada no conteúdo transmitido.
5) Função catártica ou purificadora: catarse significa alívio de tensões, desabafo. A catarse é purificadora. Essa função tem uma longa tradição ― já era apontada na Poética de Aristóteles (século IV a. C.). Tem como objetivos: a compensação, a terapêutica e a transposição da personalidade.
6) Função perenizadora: a Literatura é a ânsia de imortalidade, é o desejo de sobreviver ao tempo, perenizar-se, eternizar-se. É o desejo de todo o ser humano de extrapolar o limite espaço-temporal. O objetivo desta função da Literatura e das artes em geral é o desejo de reconhecimento.
7) Função profética: na busca de mundos imaginários, o escritor, muitas vezes prediz o futuro com precisão quase absoluta. Não é à toa que chamamos ao poeta “vate”, que significa “cognato do vaticínio” na predição (previsão do futuro).
8) Função de “arte pela arte” (parnasianos): é um fim em si mesma; é o alheamento dos problemas sociais. É a arte literária que existe apenas e tão somente em função da busca da beleza, é o isolamento para um trabalho meticuloso, sem emotividade. Busca da forma perfeita: versos perfeitos, rimas perfeitas, estrofes simétricas, palavras raras.
9) Função de fuga da realidade, do escapismo ou da evasão: a Literatura funcionaria como um elemento de evasão do “eu”, permitindo-lhe a fuga à realidade concreta que o cerca. Pode ser construtiva ou destrutiva.
* * *
Fonte: NightFoka’s Produções (www.nightfoka.cjb.net), 1999.


sábado, 21 de abril de 2018




Bolinhos Prianik


Samovar

História gastronómica
O Prianik é um bolinho de gengibre e mel geralmente servido com o chá na Rússia. Os mais simples são idênticos a cookies mas mais grossos e cobertos por açúcar em pó. Já as opções mais elaboradas, como o famoso prianik da cidade de Tula, a 200 km de Moscovo, são como fatias de pão de forma, marcados com uma prensa de madeira que produz desenhos sobre sua superfície. Podem ver aqui como se utiliza esse método: Vídeo 

Foi só no século passado que os bolinhos prianik passaram a ser consumidos como acompanhamento para o chá. Nos tempos antigos, eles eram  indispensáveis em qualquer ocasião festiva, sendo consumidos em datas especiais como nascimentos, feriados e casamentos. Tradicionalmente, os recém-casados levavam um prianik aos pais da noiva dias depois do casamento. A popularidade dos prianik era tanta que  geraram uma nova profissão: o prianichnik  que era um tipo de artesão respeitado que passava as receitas secretas da família de geração para geração. 
Por razões desconhecidas, a cidade de Tula tornou-se a capital russa do prianik. 
Ali, nos séculos XVII e XVIII, os melhores prianichnik levaram a arte de preparar o prianik ao seu apogeu, criando versões em todos os formatos imagináveis.
O famoso museu Túlski Prianik ainda permanece em Tula até os dias de hoje - assim como o museu do samovar, artigo indispensável para o chá russo nos tempos antigos.
Mas vamos ao que interessa mesmo... a receita:

 Ingredientes
  • 175g de chocolate amargo
  • 75g de manteiga
  • 120g de açúcar
  • 220g de farinha 
  • 2 ovos
  • 2 colheres de sopa de cacau em pó
  • 2 colheres de sobremesa de gengibre em pó
  • 2 colheres de sobremesa de canela
  • noz moscada a gosto
  • 2 colheres de sopa de açúcar em pó
  • ½ colher de sopa de fermento
  • Pitada de sal
  • Preparação:
  • 1. Corte o chocolate em pedaços e derreta-o com manteiga em temperatura média; em seguida, deixe arrefecer por alguns minutos.
  • 2. Bata os ovos com o açúcar em uma tigela separada.
  • 3. Misture todos os ingredientes secos, mexendo bem.
  • 4. Despeje o chocolate derretido sobre a mistura de ovo. Mexa antes de adicionar os ingredientes secos em pequenas porções.
  • 5. Misture a massa até ficar homogénea e, em seguida, leve-a ao frigorífico por 2 horas.
  • 6. Faça bolas de 2,5 cm de diâmetro com a massa.
  • 7. Passe as bolas no açúcar de em pó e distribua-as nu tabuleiro forrado com papel manteiga no fundo, deixando espaço entre elas.
  • 8. Pressione com cuidado cada uma das bolas para que fiquem levemente achatadaas.
  • 9. Leve ao forno a 165ºC por 10 minutos.
  • Tradicionalmente este bolinhos servem-se com chá, mas sintam-se livres de os servir com uma boa Vodka... 
  • Bom apetite.




"A guerra não tem rosto de mulher" transformou-nos.